A reforma da Previdência, que entrou em vigor em novembro de 2019, trouxe uma série de mudanças significativas no sistema previdenciário brasileiro. Uma dessas mudanças, que afetou diretamente a vida de aposentados por incapacidade permanente, está agora sendo questionada na Justiça.
Esta alteração na regra de cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente resultou na redução dos benefícios, levando a ações judiciais individuais e coletivas, bem como à apresentação de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6279 no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Neste artigo, exploraremos os detalhes dessa controvérsia, as implicações para os aposentados por incapacidade permanente e o posicionamento das partes envolvidas
A Reforma da Previdência e as Mudanças na Aposentadoria por Incapacidade Permanente:
Com a entrada em vigor da reforma da Previdência em 2019, uma das mudanças mais significativas ocorreu no cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente. Antes da reforma, aqueles que se aposentavam por invalidez recebiam 100% da média salarial como benefício. No entanto, após a reforma, esse valor foi reduzido para 60% da média salarial, acrescido de dois pontos percentuais para cada ano de contribuição que excedesse 20 anos para homens e 15 anos para mulheres.
Hoje em dia, a aposentadoria por incapacidade permanente é equivalente a 100% da média salarial somente quando decorrente de acidente de trabalho ou doença relacionada ao trabalho. Em relação ao antigo auxílio-doença, que agora é chamado de auxílio por incapacidade temporária, o valor continua sendo de 91% da média salarial. No entanto, a reforma da Previdência também afetou a base de cálculo da média salarial, que antes era de 80% da média dos salários de contribuição desde julho de 1994, e passou a ser de 100%. Isso significa que os menores salários agora são considerados no cálculo, resultando em uma redução do valor final do benefício.
A Repercussão na Sociedade:
Essa redução nos benefícios de aposentadoria por incapacidade permanente gerou preocupações e críticas de diversas partes da sociedade. Aqueles que se encontram em situação de incapacidade permanente e que dependem desse benefício viram suas rendas diminuírem significativamente. A aposentadoria por incapacidade permanente é geralmente destinada a indivíduos que não têm previsão de poder voltar ao mercado de trabalho, o que a torna essencial para sua subsistência.
Um dos principais pontos de controvérsia é que a reforma da Previdência parece fornecer uma proteção maior para aqueles com incapacidade temporária em comparação com aqueles que têm incapacidade permanente. Isso é evidenciado pelo fato de que os benefícios pagos por incapacidade temporária são superiores aos concedidos aos aposentados por incapacidade permanente. Para muitos, isso representa uma distorção no sistema previdenciário brasileiro e uma injustiça para os aposentados por incapacidade permanente.
A Luta na Justiça:
Diante dessa situação, muitos aposentados por incapacidade permanente decidiram recorrer à Justiça para contestar a nova forma de cálculo de seus benefícios. A Defensoria Pública da União (DPU) tem desempenhado um papel fundamental, representando diversos aposentados em ações judiciais. O caso de Katia Silene é um exemplo disso.
Katia Silene acionou a Justiça por meio da DPU para buscar a aplicação das regras de cálculo antigas, alegando a inconstitucionalidade do novo método. Inicialmente, ela obteve uma decisão favorável em primeira instância, permitindo que seu benefício fosse calculado de acordo com as regras antigas. No entanto, o INSS conseguiu reverter essa decisão, levando a DPU a recorrer novamente. Agora, o caso está suspenso, aguardando a decisão do STF.
A defensora pública federal Raphael Santoro, responsável pelo caso de Katia, critica a mudança na forma de cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente. Ele argumenta que a redução nos benefícios prejudica aqueles que dependem desse suporte financeiro. Além disso, ele destaca a disparidade entre os benefícios concedidos a pessoas com incapacidade temporária e aquelas com incapacidade permanente.

A Importância da Decisão do STF:
A decisão do STF desempenhará um papel crucial na resolução desse impasse. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6279, apresentada pelo PT, questiona a validade de diversos pontos da reforma da Previdência, incluindo a regra de cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente. O STF é a instância final para a resolução dessas questões constitucionais.
Embora a matéria esteja liberada para julgamento, ainda não há uma data prevista para a decisão do STF. A importância dessa decisão vai além dos casos individuais e pode impactar milhares de aposentados por incapacidade permanente em todo o Brasil. É uma questão que envolve não apenas a interpretação da lei, mas também a proteção dos direitos fundamentais dos trabalhadores.
O Posicionamento das Partes Envolvidas:
À medida que os aposentados por incapacidade permanente e seus representantes legais buscam soluções judiciais para reverter a diminuição de seus benefícios, o governo brasileiro, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), sustenta a legitimidade da abordagem de cálculo das aposentadorias por incapacidade permanente.
A AGU argumenta que a reforma da Previdência foi formulada com o objetivo de trazer equilíbrio atuarial e garantir a sustentabilidade do sistema previdenciário. Segundo a AGU, essa reforma reflete o esforço político para preservar o direito fundamental à Previdência Social. A AGU enfatiza que a nova regra de cálculo está em conformidade com os direitos constitucionais básicos dos trabalhadores e não desafia cláusulas pétreas da Constituição.
Além disso, a AGU ressalta que as aposentadorias por infortúnio laboral (decorrentes de acidentes de trabalho ou doenças relacionadas ao trabalho) agora recebem tratamento diferenciado em relação àquelas originadas de outras doenças. Essa diferenciação visa a considerar a natureza específica dessas situações.
A AGU invoca o princípio da separação de poderes, argumentando que o Judiciário deve apenas afastar regras que manifestamente afrontem o texto constitucional, sob pena de invadir o espaço de conformação do poder constituinte reformador. Portanto, a AGU defende a constitucionalidade da reforma da Previdência e a validade das regras de cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente.
Outras Definições que Podem Impactar a Questão:
Além da decisão do STF, outra definição importante será tomada pela Turma Nacional de Uniformização (TNU). A TNU é composta por 12 juízes federais e é responsável por julgar pedidos de uniformização de interpretação de leis federais. Ela determinará se as aposentadorias por incapacidade permanente devem ser concedidas conforme a regra de cálculo prevista na reforma da Previdência ou se devem ser revistas.
A previsão é que o processo entre na pauta de julgamento da sessão de dezembro de 2023. A TNU analisará um pedido de uniformização apresentado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra uma decisão da Turma Regional de Uniformização da 4ª Região que reconheceu o direito de um autor de ação de ter seu benefício de aposentadoria por incapacidade permanente calculado de acordo com a regra anterior à reforma da Previdência. O INSS argumentou que houve divergência entre essa decisão e outros entendimentos sobre o mesmo tema.
A controvérsia em torno da redução dos benefícios de aposentadoria por incapacidade permanente após a reforma da Previdência é uma questão complexa e de grande importância para os aposentados afetados. Enquanto o governo brasileiro defende a constitucionalidade da reforma e a validade das novas regras de cálculo, a sociedade civil e a Defensoria Pública da União argumentam que essas mudanças representam uma injustiça para aqueles que dependem desses benefícios.
A decisão do Supremo Tribunal Federal e a definição da Turma Nacional de Uniformização terão um impacto significativo na resolução desse impasse. O resultado desses julgamentos determinará se a reforma da Previdência será mantida em relação à aposentadoria por incapacidade permanente ou se as regras de cálculo serão revisadas para garantir uma proteção mais adequada aos aposentados nessa situação.
Independentemente do desfecho, essa questão destaca a importância de encontrar um equilíbrio entre a sustentabilidade do sistema previdenciário e a proteção dos direitos fundamentais dos trabalhadores que, por motivos de saúde, não podem mais contribuir para a sociedade de forma ativa. A busca por justiça e equidade continua, e a sociedade aguarda ansiosamente as decisões que afetarão a vida de muitos aposentados por incapacidade permanente no Brasil.